quinta-feira, 14 de abril de 2011

Angélica Ivo escreve sobre Alexandre Ivo - seu filho assassinado: Confissões de uma mãe

FOTO: Paula Ivo, Alexandre Ivo e Angélica Ivo (mãe)

Quero dizer que não tenho a dimensão de que minhas falas estão alcançando mais não pretendo me calar e diante disso espero está podendo de alguma forma explicitar o que verdadeiramente estou vivendo, sentindo e lutando por justiça pelo Alexandre, por nossa família e pelas pessoas que se enquadra em nossa classe social para que não deixem de acreditar que a justiça é para todos e que possam se conscientizar que também enquanto sociedade temos que fazer a nossa parte. Desde já espero que minhas palavras façam com que as pessoas entendam que o preconceito, a intolerância e o desrespeito matam dia a dia e a homofobia dilacera pessoas e suas famílias.



Eu constitui minha família aos 23 anos de idade e tive em seguida a primogênita que se chama Paula Ivo (17 anos) e um ano meio depois tive o Alexandre Ivo (14 anos) meu casamento teve um período curto de duração e voltei para casa dos meus pais e dei continuidade a minha vida juntamente com meus filhos e meus pais (eles cresceram com toda estrutura que uma família de classe média pode proporcionar) quanto à afetividade  isso nunca faltou em nossas vidas, ainda mais que os meus filhos preenchiam as nossas vidas com muita alegria e o Alexandre era o rapazinho da casa, muito protegido pela irmã e pela avó, chamava sempre a atenção porque era muito bonito e inteligente ele não se intimidava a participar de qualquer assunto, devido a minha separação eu sendo filha caçula toda minha família abraçou os meus filhos e isso gerou muito mais amor, cumplicidade, responsabilidade.



Na verdade, eu me dei conta nessa semana que passou pra ser mais exata no dia 29/03 na audiência que não aconteceu sobre o que Alexandre poderia vir a pensar na questão de sua orientação sexual e eu acredito pelo que conheço do Alexandre que talvez nem ele soubesse ou estivesse preocupado ainda com essa questão pelo simples fato de está entrando na fase do descobrimento, e quanto ao fato de amar ou deixar de amar meu filho pela escolha de sua orientação sexual não passaria nunca pela minha cabeça e nem pelo meu coração, não seria fácil, nunca é fácil ainda mais de se tratar de uma escolha que lhe traria ou não muitos momentos de auto-afirmação, enquanto pais, ficamos receosos pelo que os nossos filhos possam vir a sofrer e no caso do meu filho em particular não lhe deram essa opção... o condenaram a morte.



Nossa família acredita no contexto da palavra VALORES então somos bem ecléticos no contexto RELIGIOSO (Católicos, Espíritas e Evangélicos) no contexto RAÇA (Negros, Portugueses e Italianos), no contexto ORIENTAÇÃO SEXUAL (homossexual e heterossexual) então não teria como educa-los sem respeitar a diversidade, vivemos no Brasil e temos que crescer e educar nossos filhos com esta consciência e acima de tudo fazê-los conhecedor do significado de RESPEITO ao ser humano.



Eu não tinha conhecimento de crimes motivados por homofobia (crimes de ódio), não tinha conhecimento dos requintes de crueldade que um individuo comete com suas próprias mãos em outro ser humano motivado por homofobia, nem muito menos aceito o que leva um individuo a cometer tal crime, no meu caso, Alexandre foi seqüestrado, torturado físico e com certeza psicologicamente, ele foi agredido por mais ou menos 3 horas e pelo que tivemos conhecimento através do legista ele lutou o quanto pôde pela sua vida embora em uma luta desigual 3 homens de porte físico maior que o dele (23 anos) eu fico imaginando o quanto o meu filho implorou pela sua vida, o quanto ele pediu para que não fizessem tal violência contra ele, pois ele era um menino pacífico, tinha medo da violência e a sofreu na íntegra.



Na verdade a minha luta começou desde que soube da morte do Alexandre, primeiramente para que a polícia trabalhasse no caso e me trouxesse os verdadeiros fatos e aí quando me dei conta com a verdadeira motivação do assassinato do meu filho eu não poderia me esconder... seria como assassinar o Alexandre novamente, eu não me escondi, eu não tenho receio e nem vergonha de falar sobre o assunto, pelo contrário as pessoas têm que se dar conta de que crimes como esse pode acontecer com qualquer um, meu filho não foi assassinado em comunidade, ele foi assassinado por indivíduos de classe média que tem acesso a advogados... então vamos acordar, vamos fazer barulho e é por isso que vou fazer JUSTIÇA no caso Alexandre Ivo e infelizmente eles aguardam o julgamento em liberdade porque o nosso código penal só favorece a quem pratica o delito e não resguarda a vítima e eles vão se favorecer em não responder pelo crime de homofobia, porque o SENADO do nosso PAÍS é composto por fundamentalistas e religiosos que infelizmente são colocados por uma parte dessa nossa sociedade.



Eu na verdade ainda não tive oportunidades em relação aos pais, mas já me deparei com vários jovens que me consideram como a Mãe LGBT, como já falei não é fácil mais porque nós vamos dificultar ainda mais, temos que manter nossos filhos longe da violência, isso inclui nossa casa, respeite e com certeza será respeitado, converse, aprenda a ouvir e o aprendizado da diversidade vai ser tão natural e como eu queria ter tido essa oportunidade sendo meu filho homossexual ou não de estar hoje aqui com ele em meus braços... 



Para finalizar eu quero dizer que todos nós cidadãos temos como obrigação respeitar a diversidade como todo e nos incluirmos nela, a luta é por respeito à vida, hoje HOMOFOBIA MATA e o Alexandre Ivo retrata isso literalmente, pois vamos ficar com uma pergunta sem resposta se é que hoje isso tem tanta importância será que o Alexandre tinha se dado conta da sua orientação sexual? Isso não iremos saber por que ele já não se faz presente.



Obrigado!

Pela Criminalização da Homofobia!
Pela Vida, Pela Paz, Tortura e Impunidade, nunca mais. 

Angélica Ivo
(Mãe de Alexandre Thomé Ivo Rajão)