quinta-feira, 21 de junho de 2012

2 ANOS DE LUTO, 2 ANOS DE LUTA: ALEXANDRE (V)IVO PRESENTE



Um militante dos direitos humanos LGBT do interior do Estado do Rio de Janeiro, Rafael Menezes, do Grupo Cabo Free, presenteou a Angélica Ivo com dois poemas hoje, quando fazem 2 (dois) anos do assassinato de Alexandre Ivo, que reproduzimos abaixo.



"São dois anos apenas.


Setecentos e trinta dias de pura e infinda saudade agridoce.
São lembranças adocicadas que se deixam arranhar pela mais salgada das amarguras.



Ela quase que beira a insanidade disfarçada. Toma calmantes a mais, chora a mais, fica acordada a mais no vazio de sua existência que acredita ter perdido o sentido.



O que ela não sabe é do plano de Deus. Nosso corpo de nada mais serve quando nosso espírito cumpriu o que se havia de cumprir e assim tem sido por todo sempre.

Acredito que a saudade dele seja igual ou quem sabe maior, não há como romper o vinculo eterno entre mãe e filho. Acredito também que ele já esteja mais próximo, basta substituir o sofrimento pelo atentamento e observar que aquela lágrima já não é tão encorpada como há dois anos atrás, isso porque ela já precisa dar espaço pra felicidade chegar.

Nada é por acaso meu amor, acredite nisso fielmente. Tudo é apenas um desencontro triste mas necessário para que os desígnios de quem deu a feliz oportunidade de que você mãe dele sejam cumpridos.

É tudo questão de disciplina e atenção. É transferir a melancolia por saudade doce, é trocar a tristeza pelos estudos da alma e as coisas certamente vão se acalmar.

A nossa vida é o nosso livro e saber lê-lo é a maior dádiva que podemos negociar com o destino que não escreve nada por acaso, nada mesmo.

Um dia essa saudade da lugar ao reencontro e vais perceber o quão boba parecestes pra uma situação que só precisava do tempo exato pra por um sorriso tua face. Como eu disse, é tudo uma questão de contentamento, aceitação e disciplina.

Às vezes ele chega a te tocar a face, mas talvez você não sinta porque existe ainda uma camada tenra de lágrimas adormecendo seu rosto. Seque-as , enxugue-se, dispa-se desse remendo invulnerável e se deixe absorver . 
Feche os olhos apenas e irás escutar o sussurro do amor em teus tímpanos, dizendo “ Mãe, não chore mais por mim, apenas sorria porque o que havia de ser feito eu fiz, cumpri minha missão, que nada mais era do que ser seu filho, estive ai pra isso, para que você pudesse me dar seu imenso amor”

Angélica, Deus sabe realmente o que faz e já é hora de seguir em frente. Observe o que realmente importa nessa trajetória e foque no que ameniza a angustia de não telo mais fisicamente. Deixe-se lavar das tristezas, deixe essa pedra que carregas no bolso de trás na próxima estação de trem e siga adiante.

Alexandre não foi embora pra sempre, como você não está aqui pra sempre. É tudo questão de disciplina, estudo e percepção. 
O amor sempre está mais próximo do que podemos perceber.

Um grande beijo no avesso do seu coração".




Fragmento do outro texto enviado:

"Eu já li e reli tudo o que ele escreveu, os planos que traçou inutilmente, os anseios de menino bobo, meu filho bobo.
Por Deus, trocar o que pelo que? Não existe ouro, não existe riqueza que se sobreponha ao flagelo que sou hoje por dentro 
e não há amor que supra o esgoto em que se transformou meu coração.
Eu tento sobreviver diante do colapso que se tornou minha existência inútil olhando pelo ângulo que fui impedida de vê-lo se mutar em adulto. O que faço agora?
Eu viajo na luta por justiça, eu cai de cabeça no poço de vaidades e egoísmos que é a militância em nome do meu filho que por sua vez,nunca me disse que era gay. Eu preciso absorver calada as criticas, a dúvida, a calunia, quando eu somente queria estar cozinhando pra ele que nos meus sonhos estaria prestes a chegar .
Eu faço de tudo pra suprir a necessidade absoluta de continuar a criá-lo, de protegê-lo e isso não é possível.
Eu me entrego a falas, a desabafos, a momentos em que acontece um silêncio para me ouvirem, observo lágrimas, algumas verdadeiras, outras não, já que a dor de ter um filho morto só sabe quem teve que enterrar o amor em uma cova e deixá-lo pra trás para que a vida de uma maneira que ainda não descobri qual é, continue, porque dizem que eu ainda estou viva e eu não sei se é isso é realmente verdade.
Depois que a fala se encerra, observo que a minha luta é somente minha".


Rafael Menezes
ONG Cabo Free
Cabo Frio - RJ

ALEXANDRE (V)IVO PRESENTE!

Um comentário:

  1. Lindo os textos acima.
    Força, Angélica, o melhor ainda está por vir.
    Fique na paz de Deus.

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